e todos os dias te revejo em cada moto que passa e as persigo tentando, loucamente, seguir-te com o pavor de roçar a roda traseira e de te ver voar e, de novo, te sentir esmagado pela força da gravidade. e com a chuva salgada lavo a tua ausência e a dor por ela consentida na certeza de que jamais nos reveremos.
saudades dos abraços que não demos. do teu sorriso de soslaio desconfiado. são saudades do tempo que não virá nas memórias que se sustentam.
é o egoísmo de te querer de ter aqui.
hoje o Águia faz anos. e está só.
faz sentido celebrar a vida. a morte não ficará célebre.
persigo recolhendo os pedaços em que se fragmentou a existência. esparsos pela densa floresta nocturna recolhem-se as gotas de sangue, farrapos de vida para a reconstituir.
não se apagam as marcas da cisão, as costuras do tempo e do sofrimento. é sempre com alegria que se recolhe a vida. os pedaços de vida que se distribuem nos sons dos tambores selváticos que a natureza ecoa e que ouvidos surdos e olhos ofuscados dificilmente vislumbram.
é a eterna luta entre a vida e a morte.